Somente a Verdade
Por: Sergio Portella
Quem escreveu este livro não existe mais simplesmente porque na época em que essa escrita apareceu, o autor tinha pai. E é possível separar um ser de seus pais? É como olhar a foto amarelada de alguém que já morreu, achar graça da pose, da roupa, do sorriso e com um carinho estranho fazer as contas e saber que não é mais possível que esteja viva. A inexorabilidade do tempo e sua melancolia inadequada! Sim, esse autor não existe mais. Por isso fique tranquilo e só leia o que gostar... salte se for preciso, feche os capítulos se se chatear, e esqueça o tomo nas estantes dos tomos esquecidos, como se ele fosse um ser extinto, sem registro, abissal, celacanto, como ele é!
É uma obra estranha para seres humanos esquisitos que não suportam mais as suas carnes, nem mesmo seus pensamentos. São para aqueles que estão além. Não existe moral, não existe humanismo, não existe a defesa da espécie humana de maneira alguma. Só quer o sorriso furtivo e inesperado de um bom dia perdido e quase automático. Algo que é bom e existe por si mesmo sem que seja necessária sua lembrança, assim como a vida de cada vida microscópica ou monumental no ato de existir - que por si só basta! Lento como um celacanto que se queria extinto, mas que é misterioso simplesmente por existir. Um bater inexpressivo e sem sentido humano de pálpebras, que vale só por si mesma. Uma flor que perde a primeira pétala de seu fim. Um raio de sol maravilhoso que nenhuma câmera nem ninguém registrou.
E como naquela foto antiga você pode reconhecer o esforço da criança em se parecer humana, ou de um chimpanzé que finge o seu olhar como se pudesse proferir as primeiras palavras que te fariam exclamar “ele fala”, pode-se ver nestas histórias a identificação do mistério de estar vivo sem ter nenhuma consciência do que isso pode representar! O celacanto é a expressão dessa perplexidade, de que para além dos pensamentos e da mente, existem as células vivas em si mesmas pulsando para sempre no eterno presente. Que em qualquer situação de vida, extraordinária ou comum, é possível encontrar um celacanto, sonolento, quase paralisado, assustadoramente quieto, silencioso. Que em qualquer situação de vida, seja medíocre – e todas o são – seja querida – e todas a podem ser -, este celacanto pode se dirigir para a superfície, em busca de ar sem ter pulmões, e antes de explodir pela falta de pressão, provocar a tsunami que Tóquio nunca irá esquecer, o maremoto que fará das geografias novos países mutantes. Este livro é o registro desta perplexidade e, como toda perplexidade, paralisou e matou o autor. Mas a sua morte tinha a força da letargia – por milhões de anos – da espécie dos celacantos no fundo abissal das possibilidades humanas. Uma espera evolutiva para saltar, e tsunamicamente se transformar em uma inscrição enigmática e koânica no muro da espécie humana: celacanto provoca maremoto!
Um comentário:
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